Madrid: a tourada

As touradas, que em castelhano se chamam corridas de toros, são o espetáculo popular mais antigo e famoso da Espanha. O festejo vai muito além de uma simples matança de animais - há todo um ritual e um simbolismo por trás.

Como eu já disse no post anterior, na verdade, nós assistimos a uma novillada, que é uma corrida com toureiros ainda não profissionais. É como se fosse a Série B das touradas, que tem como "série C" as becerradas. Embora haja diferença quanto ao profissionalismo do matador e a qualidade do animal, o rito é o mesmo.

Muita gente faz cara feia quando contamos que fomos a uma, principalmente por causa da história toda dos direitos dos animais. Mas, na minha opinião, foi uma das melhores coisas que fizemos na Espanha. Não tem nada mais típico e é realmente emocionante e empolgante acompanhar uma delas ao vivo.

O ingresso dá direito a assistir 6 corridas de toros ao longo de uma tarde, cada uma durando geralmente meia hora. Com as informações disponíveis no programa que se recebe com a entrada, pode-se entender mais ou menos como funciona e quem são os matadores que farão cada corrida.

A programação se inicia com uma saudação aos presentes e à maior autoridade presidindo as corridas. Há até um camarote para o Rei.

Cada corrida começa com um paseíllo, que é um desfile de apresentação do matador, do picador, dos banderilleros e do restante do pessoal da Plaza de Toros. A foto abaixo demonstra esse momento.

Depois, o pessoal se retira e só ficam aqueles que participam do tercio de varas, o primeiro pelo qual o touro passa logo que entra na arena. Nesse terço inicial, representado na foto abaixo, o touro é lidiado pelo toureiro com um capote cor-de-rosa, bem como por outros auxiliares.

Ainda nesse terço, o picador, a cavalo, entra na arena e começa a cutucar com uma lança o cangote do animal, para testar a sua bravura e capacidade de investida. Se o picador se passa e fere demais o animal, a platéia fica possessa de raiva e começa a xingar o indivíduo, dizendo que ele vai matar o bicho antes do matador. O touro geralmente fica ainda mais bravo e começa a tentar atacar o cavaleiro, investindo contra o cavalo, que tem uma proteção especial.

O momento seguinte é o tercio de banderillas, quando os banderilleros, auxiliares do matador, bem como o próprio matador, começam a cravar pares de banderillas no cangote do touro.

As banderillas são umas varetas decoradas com uns topinhos coloridos, com uns ganchos nas pontas, de forma que, uma vez cravadas, ficam meio penduradas uma para cada lado. O objetivo é deixar o animal mais irritado com aquelas coisas penduradas, batendo no seu corpo, das quais não consegue se ver livre.

Cravados quatro pares de banderillas, o matador fica sozinho na arena e recebe a sua espada, a qual esconde atrás de um capote vermelho. Tem início o tercio de muerte. É esse o momento em que o matador tem que mostrar a que veio. As manobras mais ousadas consistem justamente em atrair o touro até onde está o capote vermelho e, com elegância, fazê-lo de bobo com um simples gesto.

Depois de várias manobras, chega o momento de matar o touro. O matador tem que encará-lo de frente e o ideal é que consiga sacrificar o animal com um só golpe de sua espada, que para ser fatal deve entrar bem no meio do cangote do touro e atingir algum órgão vital.
Quando o toureiro consegue, a platéia delira, aplaude em pé. Às vezes, são necessários mais golpes. Noutras, fica tragicômico, pois o bicho não morre e o matador começa a ficar meio nervoso, tentando matá-lo a todo custo. A platéia vaia quando percebe isso.

Em algumas das corridas daquela tarde, o animal caiu no mesmo momento em que foi apunhalado de morte. Noutras, ele sai andando meio bobo, até que cai. Quando o bicho já está no chão, o matador vem com um punhal e dá uma apunhalada na cabeça, para certificar que ele está morto. Em seguida, corta a orelha do touro e a oferece ao público como prova de sua façanha.

Por fim, o animal é recolhido e ainda dão um giro pela arena arrastando seu corpo.
Isso se repete nas 6 corridas ao longo da tarde, sempre intercaladas por anúncios e pela banda com trompetes.

É muito engraçado ver como a platéia se manifesta. Assim como num jogo de futebol num estádio, ela é sempre um show à parte. Sempre tem um valentão que levanta para gritar alguma coisa incompreensível para xingar alguém lá embaixo, e só pára quando os demais mandam ele ficar quieto.

Um outro fato inusitado que não conhecíamos por nunca ter visto na TV nem ouvido falar é o que acontece quando o touro é manso demais e não se presta à tourada. A corrida é abortada e soltam-se várias vacas e bois dentro da arena, para que o bicho se acalme. Em seguida, abre-se uma porta de saída e todos são levados embora juntos.

Reza a etiqueta das corridas que não se deve ficar tirando foto do espetáculo, mas, sinceramente, não estávamos nos importando muito com isso - queríamos era registrar a experiência e, por sorte, ninguém nos repreendeu enquanto usamos a máquina.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

União Europeia, Espaço Schengen e Zona do Euro (ATUALIZADO até 07/2019)

Budas e Budas

De Kamakura a Enoshima